Certo dia passando em uma praça
do centro da minha cidade, me deparei com um senhor com olhos marejados sentado
em um banco antigo, castigado pelo tempo, ali estava contando uma história, que
deixara um pequeno menino em aparente situação de abandono. Os olhos do menino
brilhavam! Ele estava totalmente mergulhado na história daquele senhor, de voz
branda e cansada.
Essa situação tão exótica me fez
diminuir o ritmo das minhas passadas, e retornar para ficar mais próxima para
observar melhor.
Essa situação tão exótico, no
meio da cidade, nesse mundo caótico, justo no fim de tarde, horário de rush.
Enquanto muitos correm de um lado para o outro, tropeçando em sua própria
rotina frenética... Não há tempo para olhar ao seu redor!
Me aproximei e sentir algo
diferente.Naquele ambiente simples de um surrado banco de praça, alguém doava
um pouquinho do seu tempo para ouvir o outro, para compartilhar o que a vida te
deu. Não sei dizer mas, algo me emocionou! De onde eu estava só via o distinto
senhor mover os lábios, com olhos visivelmente emocionados. Mas é como se uma
áurea mágica me envolvesse naquele contexto.
Venci a vergonha, me aproximei
mais, e pedir para sentar e ouvir também a história. O senhor elevando as mão
ao rosto para secar as insistentes lágrimas que pela sua face escorria.
Com a cabeça, movia lentamente,
eis um sinal de aceitação. Não ouvi a história toda mas o pouco que ouvir
mudaram a minha vida! E é ela que te conto hoje:
Numa cidadezinha qualquer do
interior, morava em uma praça, ao pé de um flamboyant majestoso, diziam
centenário, morava clara. Que como muitas crianças sofrem nas rua frias, sem
nenhuma proteção... Mas clara era diferente!
Ela apresentava ter 6 aninhos.
Uma pouco mais de um metro de estatura, miúda, sempre com o mesmo vestido
rodadinho surrado pelo tempo, esgarçado... e bem encardido. Clara nunca foi
vista com ninguém, nenhum adulto, ou quem quer que seja. Na cidade ninguém sabe
como ela chegara aquela praça, nem mesmo a quanto tempo ela estaria ali. Só
tinha algumas folhas e giz de cera, sua companhia era seus desenhos e uma boa
sombra da sua árvore-moradia.
- Sempre passava por aquela
praça, mas com a pressa de um professor, recém-formado, que para que para se
sustentar conciliava duas escolas.
Era final de ano, e junto com
ele, o término do ano letivo, e minha correria diária esvaiam-se. Continuava a
histórica.
Incomodado com a presença daquela
menina tão desprovida de tudo e mesmo assim tão alegre, com seus desenhos? Um
encanto lúdico de saltar aos olhos. Durante um café numa padaria ao redor
daquela praça e numa conversa de ocasião perguntou sobre a menina.
Foi nesse dia que conheceu o nome
dela. - E não haveria um nome mais vai
propicio, pois nela havia uma luz nítida a todos. O único momento que um
sorriso espontâneo apareceu por dentre as lagrimas daquele homem tão cativante.
A história era tão intrigante, que aquela conversa
toda girou em torno de Clara. O balconista lhe disse entre um cafezinho e
outro, que Clara não largava do papel e seu giz de cera o dia todo! Ele mesmo
passava sempre por lá, para levar mais papel... um lanche. Pois ela nada pedia
a ninguém, não trabalhava no sinal, nem ao menos se mostrava sofrida perante uma
oportunidade de conseguir alguns trocados. Realmente pra mim tudo era algo
inédito e simplesmente surpreendente! E atenta e ansiosa mantinha meus olhos
fitos nele.
- Sai de La perplexo com tudo o
que vi e ouvi! O natal estava tão próximo... Tocado por toda aquela situação,
imaginei: toda criança quer brinquedos, ou o sonho realizado de ver o papai
Noel. Mas aquela menina nada tinha!
Não me contive e ao entardecer,
fui até lá. Ao abordá-la fiquei
abismado! Cheguei na intenção de saber o que ela pediria ao papai Noel nesse
natal. Sai de casa realmente preparado para comprar o que quer que fosse para
lhe amenizar a tristeza de passar o natal no frio das ruas... Sozinha! Dizia
aquele senhor que até hoje não sei o nome, mas em suas palavras havia tanta
graça apesar do seu calado sofrimento ao retratar tudo aquilo para nós, então
também me desmanchava em lágrimas que até então, elas caiam por empatia com o
sofrimento que imaginei que alguém tão pequena tinha que suportar.
Questionada, Clara disse em meio a sorrisos para seus desenhos coloridos e
olhinhos brilhando para eles como um encontro de amor com aquele frágil papel:
- Moço, não preciso de nada! Não quero nada não! O papai Noel é meu amigo e vem
me visitar todos os dias quando a lua apareci láaaaa... no céu. Por isso que eu
torço para o sol dormir cedinho, que o dia apague logo para me encontrar com
ele! Entusiasmada dizia a ele, a pobre menininha.
De embasbacado, se afastou dela
emocionado e admirado com tanta doçura em meio uma realidade dura e de total
abandono... Não se contendo ao imaginar quem concedia a ela noites tão lindas
ao findar do dia. A maioria das crianças tem medo de escuro.
Ao me virar frente a ela, mesmo
ao longe, caiu ao chão de joelhos! Estava fascinado! Estarrecido, por achar que
os seus olhos o enganavam e que aquela cena não podia ser verdade.
Lá estava clara ao pé do
solene flamboyant, e seus desenhos de
uma forma surreal saiam do papel ganhando vida! Dançavam e brincavam com ela.
Tudo que sua imaginação podia projetar no papel ele conseguia tornar real todo
anoitecer.

Como os outros, eis que o papai
Noel chega. Com um vovô amoroso, abraçava a menina, a dava comida em sua boca.
Com elas em seu colo contava histórias pra ela dormir. Em meio aos sussurros do
soninho da pequenina, jurava-lhe em branda voz: - Eu sou papai no Noel todos os
dias e prometo a você, todos os dias velarei o seu sono, realizarei os seus
sonhos e trarei presentes segundo o seu coração, por tanto nunca terás fome!
Atônica, e sem contar a torrente
de lágrimas, demorei alguns minutos para cair em mim, o mundo em minha volta
parou! Percebi como sou pequena perante a fé inerente em toda criança. Onde a
minha se perdeu? Porque perdi a capacidade de sonhar e realizar?
Compreendi então, que não preciso
de nada que sempre persegui para encontrar a felicidade... Está tudo em mim! E
carrego a certeza de que nunca estou só, e se, meu coração merecer todo dia
será natal!
Há momentos em que a realidade
não é nada além de dor. E para escapar desta dor, devemos sair da realidade.
a
0 comentários:
Postar um comentário