domingo, 27 de dezembro de 2015

[Conto] O Natal Encantado - Mariane Helena


Certo dia passando em uma praça do centro da minha cidade, me deparei com um senhor com olhos marejados sentado em um banco antigo, castigado pelo tempo, ali estava contando uma história, que deixara um pequeno menino em aparente situação de abandono. Os olhos do menino brilhavam! Ele estava totalmente mergulhado na história daquele senhor, de voz branda e cansada.
Essa situação tão exótica me fez diminuir o ritmo das minhas passadas, e retornar para ficar mais próxima para observar melhor.
Essa situação tão exótico, no meio da cidade, nesse mundo caótico, justo no fim de tarde, horário de rush. Enquanto muitos correm de um lado para o outro, tropeçando em sua própria rotina frenética... Não há tempo para olhar ao seu redor!
Me aproximei e sentir algo diferente.Naquele ambiente simples de um surrado banco de praça, alguém doava um pouquinho do seu tempo para ouvir o outro, para compartilhar o que a vida te deu. Não sei dizer mas, algo me emocionou! De onde eu estava só via o distinto senhor mover os lábios, com olhos visivelmente emocionados. Mas é como se uma áurea mágica me envolvesse naquele contexto.
Venci a vergonha, me aproximei mais, e pedir para sentar e ouvir também a história. O senhor elevando as mão ao rosto para secar as insistentes lágrimas que pela sua face escorria.
Com a cabeça, movia lentamente, eis um sinal de aceitação. Não ouvi a história toda mas o pouco que ouvir mudaram a minha vida! E é ela que te conto hoje:
Numa cidadezinha qualquer do interior, morava em uma praça, ao pé de um flamboyant majestoso, diziam centenário, morava clara. Que como muitas crianças sofrem nas rua frias, sem nenhuma proteção... Mas clara era diferente!
Ela apresentava ter 6 aninhos. Uma pouco mais de um metro de estatura, miúda, sempre com o mesmo vestido rodadinho surrado pelo tempo, esgarçado... e bem encardido. Clara nunca foi vista com ninguém, nenhum adulto, ou quem quer que seja. Na cidade ninguém sabe como ela chegara aquela praça, nem mesmo a quanto tempo ela estaria ali. Só tinha algumas folhas e giz de cera, sua companhia era seus desenhos e uma boa sombra da sua árvore-moradia.
- Sempre passava por aquela praça, mas com a pressa de um professor, recém-formado, que para que para se sustentar conciliava duas escolas.
Era final de ano, e junto com ele, o término do ano letivo, e minha correria diária esvaiam-se. Continuava a histórica.
Incomodado com a presença daquela menina tão desprovida de tudo e mesmo assim tão alegre, com seus desenhos? Um encanto lúdico de saltar aos olhos. Durante um café numa padaria ao redor daquela praça e numa conversa de ocasião perguntou sobre a menina.
Foi nesse dia que conheceu o nome dela. -  E não haveria um nome mais vai propicio, pois nela havia uma luz nítida a todos. O único momento que um sorriso espontâneo apareceu por dentre as lagrimas daquele homem tão cativante.
 A história era tão intrigante, que aquela conversa toda girou em torno de Clara. O balconista lhe disse entre um cafezinho e outro, que Clara não largava do papel e seu giz de cera o dia todo! Ele mesmo passava sempre por lá, para levar mais papel... um lanche. Pois ela nada pedia a ninguém, não trabalhava no sinal, nem ao menos se mostrava sofrida perante uma oportunidade de conseguir alguns trocados. Realmente pra mim tudo era algo inédito e simplesmente surpreendente! E atenta e ansiosa mantinha meus olhos fitos nele.
- Sai de La perplexo com tudo o que vi e ouvi! O natal estava tão próximo... Tocado por toda aquela situação, imaginei: toda criança quer brinquedos, ou o sonho realizado de ver o papai Noel. Mas aquela menina nada tinha!
Não me contive e ao entardecer, fui até lá.  Ao abordá-la fiquei abismado! Cheguei na intenção de saber o que ela pediria ao papai Noel nesse natal. Sai de casa realmente preparado para comprar o que quer que fosse para lhe amenizar a tristeza de passar o natal no frio das ruas... Sozinha! Dizia aquele senhor que até hoje não sei o nome, mas em suas palavras havia tanta graça apesar do seu calado sofrimento ao retratar tudo aquilo para nós, então também me desmanchava em lágrimas que até então, elas caiam por empatia com o sofrimento que imaginei que alguém tão pequena tinha que suportar.


Questionada, Clara disse em meio a sorrisos para seus desenhos coloridos e olhinhos brilhando para eles como um encontro de amor com aquele frágil papel: - Moço, não preciso de nada! Não quero nada não! O papai Noel é meu amigo e vem me visitar todos os dias quando a lua apareci láaaaa... no céu. Por isso que eu torço para o sol dormir cedinho, que o dia apague logo para me encontrar com ele! Entusiasmada dizia a ele, a pobre menininha.

De embasbacado, se afastou dela emocionado e admirado com tanta doçura em meio uma realidade dura e de total abandono... Não se contendo ao imaginar quem concedia a ela noites tão lindas ao findar do dia. A maioria das crianças tem medo de escuro.
Ao me virar frente a ela, mesmo ao longe, caiu ao chão de joelhos! Estava fascinado! Estarrecido, por achar que os seus olhos o enganavam e que aquela cena não podia ser verdade.
Lá estava clara ao pé do solene  flamboyant, e seus desenhos de uma forma surreal saiam do papel ganhando vida! Dançavam e brincavam com ela. Tudo que sua imaginação podia projetar no papel ele conseguia tornar real todo anoitecer.

Como os outros, eis que o papai Noel chega. Com um vovô amoroso, abraçava a menina, a dava comida em sua boca. Com elas em seu colo contava histórias pra ela dormir. Em meio aos sussurros do soninho da pequenina, jurava-lhe em branda voz: - Eu sou papai no Noel todos os dias e prometo a você, todos os dias velarei o seu sono, realizarei os seus sonhos e trarei presentes segundo o seu coração, por tanto nunca terás fome!

Atônica, e sem contar a torrente de lágrimas, demorei alguns minutos para cair em mim, o mundo em minha volta parou! Percebi como sou pequena perante a fé inerente em toda criança. Onde a minha se perdeu? Porque perdi a capacidade de sonhar e realizar?
Compreendi então, que não preciso de nada que sempre persegui para encontrar a felicidade... Está tudo em mim! E carrego a certeza de que nunca estou só, e se, meu coração merecer todo dia será natal!
Há momentos em que a realidade não é nada além de dor. E para escapar desta dor, devemos sair da realidade.

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